terça-feira, 8 de setembro de 2009

Cheque em branco

O Estado de São Paulo

Dora Kramer

Se o presidente Luiz Inácio da Silva deseja mesmo, como disse em seu pronunciamento de domingo à noite, que a sociedade se engaje na questão do pré-sal, é preciso mais do que exortar as pessoas a se "mobilizarem" e "pressionarem" o Congresso a aprovar o quanto antes os projetos das normas de exploração do petróleo.

É necessário dar todas as informações, estimular a circulação de ideias, opiniões, abrir espaço à crítica, conduzir o assunto de maneira aberta e consistente, explicando como e porquê a população deve e pode influir na discussão.

Do jeito como a coisa está sendo posta - e o foi com ênfase absoluta no domingo - o presidente parece mais um ativista em seu ofício de recrutamento de seguidores dispostos a aderir cegamente a uma causa.

Tirando os especialistas, o que as pessoas sabem sobre o pré-sal é o que o governo diz. E o governo, pela voz do presidente da República, não informa, panfleta.

O modelo de exploração proposto, disse Lula em seu discurso, "impede que qualquer governante gaste de forma irresponsável os recursos" que assim, irão para "a educação, ciência e tecnologia, cultura, defesa do meio ambiente e combate à pobreza".

Além do mais, garante o "futuro dos nossos filhos e netos", mantém o petróleo "nas mãos do povo", assegura "o progresso" e é a representação material da independência, impedindo que ela seja apenas "um quadro na parede e um grito congelado na história".

Palavras que produzem efeito, mas não propiciam conhecimento. E sem conhecer - digamos, não total, mas mais ou menos do que se trata, com prós e contras, mediante o exame do contraditório -, a sociedade não pode verdadeiramente se "mobilizar" e "pressionar" o Congresso contra os "interesses menores da oposição", entre outros motivos porque não sabe se são mesquinhos mesmo ou se fazem realmente sentido.

Só se sabe o que o governo diz: a proposta do marco regulatório enviada ao Congresso é o "bem" e as discordâncias representam o "mal".

Desse modo, o governo trata os brasileiros não como cidadãos com direito ao exercício do discernimento mediante todas as variantes em jogo, mas como massa de manobra.

A tropa de choque governista no Congresso funciona nessa base. Mas, no caso, o preço já está incluído no serviço.

À sociedade é preciso convencer com argumentos racionais, inteligíveis, simples, porém não simplificadores da realidade ao ponto de reduzi-la a uma disputa entre patriotas interessados no melhor para o País e traíras da pátria, empenhados no pior para o Brasil.

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